sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Morreu Fausto Wolff

Faustin von Wolffenbüttel (1940-2008) foi correspondente de guerra, escritor, dramaturgo, professor de literatura nas universidades de Copenhague e Nápoles. Editou o Pasquim e colaborou com a saudosa revista Bundas, onde criou o hilariante personagem Nathaniel Jebão, colunista social ultra-reacionário e racista. Pretendo resgatar trechos dessas colunas ocasionalmente.

O velho Lobo possuía uma página eletrônica, onde é possível conhecer alguns de seus textos. Foi-se um grande boêmio, comunista teimoso, gênio da crônica. Abaixo, em texto de 2006, ele comenta um derrame que sofreu.

“Outro dia quase bati as botas. Fechado o expediente, fiquei bebendo uísque enquanto olhava o mar. À medida que bebia, mais o mar se agitava, me agitando também. Tive uma idéia genial e voltei ao computador, mas - vejam só - não conseguia escrever as frases direito. Era sempre aprotaledo pelas pavrolas. Retornei à janela, fiquei vendo o mar e tendo idéias geniais. Bebi mais algumas doses de uísque e, quando minha mulher voltou do trabalho (é, meus filhos, alguém tem de prover), contei-lhe o que ocorrera. Ela: ''Você teve um princípio de enfarte ou um princípio de isquemia'', e, sob meus discretos protestos, arrastou-me ao hospital.

Colocaram-me num leito ao lado de muitos outros, separados por um lençol. Braços furados por mil agulhas, fui vítima de um clister e do resultado do clister, tudo isso em meio a dezenas de pessoas que fingiam ignorar minha indiscreta performance. Lá pelas nove da manhã fugi do hospital e fui caminhando por Ipanema. Acabei num boteco em frente ao estúdio do Millôr, na Gomes Carneiro. Tomei um conhaque, comi um sanduíche de pernil e fumei um cigarro. Bateu-me a vontade de escrever um poeminha. Pedi lápis e caneta, mas as mãos não obedeciam ao cérebro.

Só depois de desenhar mentalmente a letra é que conseguia reproduzi-la no papel e ainda assim muito mal. Desisti do poema e fui pedir a opinião do Millôr, que há 50 anos é uma espécie de irmão mais velho. Aconselhou-me a voltar ao hospital, o que fiz de táxi desta vez. As enfermeiras me receberam de braços abertos e nem me torturaram. Tivera mesmo uma isquemia. Três dias depois, feitos todos os exames, me mandaram embora e proibiram-me de fazer as três coisas de que mais gosto: ver Mannhattan connection, discutir com adolescentes e ler originais não solicitados.

Caíram nessa? Não acredito. É isso mesmo que vocês pensaram. Estou proibido de fumar, beber e procriar, pois, no meio de uma dessas atividades, o sangue pode derrapar na veia e sair da pista da minha vida, que pode não ser grande coisa mas é minha. Por isso nunca mais fumei, bebi e procriei ao mesmo tempo.

Tudo tem seu tempo certo.

fonte: Guilherme Scalzilli

11/09




Seguramente, esta será a última oportunidade em que poderei dirigir-me a vocês. A Força Aérea bombardeou as antenas da Rádio Magallanes. Minhas palavras não têm amargura, mas decepção. Que sejam elas um castigo moral para quem traiu seu juramento: soldados do Chile, comandantes-em-chefe titulares, o almirante Merino, que se autodesignou comandante da Armada, e o senhor Mendoza, general rastejante que ainda ontem manifestara sua fidelidade e lealdade ao Governo, e que também se autodenominou diretor geral dos carabineros.

Diante destes fatos só me cabe dizer aos trabalhadores: Não vou renunciar! Colocado numa encruzilhada histórica, pagarei com minha vida a lealdade ao povo. E lhes digo que tenho a certeza de que a semente que entregamos à consciência digna de milhares e milhares de chilenos, não poderá ser ceifada definitivamente. [Eles] têm a força, poderão nos avassalar, mas não se detém os processos sociais nem com o crime nem com a força. A história é nossa e a fazem os povos.

Trabalhadores de minha Pátria: quero agradecer-lhes a lealdade que sempre tiveram, a confiança que depositaram em um homem que foi apenas intérprete de grandes anseios de justiça, que empenhou sua palavra em que respeitaria a Constituição e a lei, e assim o fez.

Neste momento definitivo, o último em que eu poderei dirigir-me a vocês, quero que aproveitem a lição: o capital estrangeiro, o imperialismo, unidos à reação criaram o clima para que as Forças Armadas rompessem sua tradição, que lhes ensinara o general Schneider e reafirmara o comandante Araya, vítimas do mesmo setor social que hoje estará esperando com as mãos livres, reconquistar o poder para seguir defendendo seus lucros e seus privilégios.

Dirijo-me a vocês, sobretudo à mulher simples de nossa terra, à camponesa que nos acreditou, à mãe que soube de nossa preocupação com as crianças. Dirijo-me aos profissionais da Pátria, aos profissionais patriotas que continuaram trabalhando contra a sedição auspiciada pelas associações profissionais, associações classistas que também defenderam os lucros de uma sociedade capitalista. Dirijo-me à juventude, àqueles que cantaram e deram sua alegria e seu espírito de luta.

Dirijo-me ao homem do Chile, ao operário, ao camponês, ao intelectual, àqueles que serão perseguidos, porque em nosso país o fascismo está há tempos presente; nos atentados terroristas, explodindo as pontes, cortando as vias férreas, destruindo os oleodutos e os gasodutos, frente ao silêncio daqueles que tinham a obrigação de agir. Estavam comprometidos. A historia os julgará.

Seguramente a Rádio Magallanes será calada e o metal tranqüilo de minha voz não chegará mais a vocês. Não importa. Vocês continuarão a ouvi-la. Sempre estarei junto a vocês. Pelo menos minha lembrança será a de um homem digno que foi leal à Pátria. O povo deve defender-se, mas não se sacrificar. O povo não deve se deixar arrasar nem tranqüilizar, mas tampouco pode humilhar-se.

Trabalhadores de minha Pátria, tenho fé no Chile e seu destino. Superarão outros homens este momento cinzento e amargo em que a traição pretende impor-se. Saibam que, antes do que se pensa, de novo se abrirão as grandes alamedas por onde passará o homem livre, para construir uma sociedade melhor.

Viva o Chile! Viva o povo! Viva os trabalhadores! Estas são minhas últimas palavras e tenho a certeza de que meu sacrifício não será em vão. Tenho a certeza de que, pelo menos, será uma lição moral que castigará a perfídia, a covardia e a traição.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

DESFORMAS e "Leitura dos três livros": debates sobre O capital de Marx.

Desformas
Começa nesta semana a nova rodada do grupo de estudos d`O Capital de Karl Marx na USP, sexta-feira dia 05/09 ocorrerá o debate sobre o capítulo V do livro I, no auditório da Geografia/USP às 14h30, o debate será organizado pelo Prof. Ruy Braga. No dia 17/09 será debatido os capítulos XXII e XXIV com o Prof. Hector Benoit (da Unicamp), na sala 12 do Dep. de Ciências Sociais da USP.

"O Centro de estudos Desmanche e Formação de Sistemas Simbólicos, vinculado aos departamentos de Artes Plásticas e de Cinema, Rádio e TV da ECA-USP, constitui um foro de debates e reflexões multidisciplinares, de corte histórico e materialista, congregando, em torno de questões estéticas, simbólicas e do estudo da história em geral, pesquisadores de diferentes especialidades. Não obstante a heterogeneidade inerente à variedade das especialidades de seus membros, o Centro nasce, em síntese, a partir da preocupação comum dos integrantes, com a crítica transformadora da contemporaneidade, mediada por uma perspectiva histórica voltada para a superação do capitalismo." (DESFORMAS)

Leitura dos três livros
Paralelamente realiza-se o seminário "Leitura dos Três Livros" organizado pelo CEMAX (Centro de estudo marxistas - UNICAMP), que acontece na sede do Sindicato dos Jornalistas, à Rua Rego Freitas, 530 - (Metrô República) São Paulo.

Após a apresentação sintética dos livros I e II (26 de Maio a 10 de Novembro de 2008) será retomada a leitura detalhada de O Capitala a partir do livro III, "uma leitura capítulo a capítulo".
Mais informações e calendário clique aqui.